Saltar para: Posts [1], Pesquisa e Arquivos [2]



As escolhas da CDU

Quarta-feira, 28.10.09
id="BLOGGER_PHOTO_ID_5397643781004380146" />


Vêm alguns dos meus amigos e companheiros de partido mostrando alguma irritação pela preferência demonstrada pela CDU, na composição de juntas de freguesia, em relação ao PSD. Os comentários feitos por putativos apoiantes dessa força política são, regra geral, de uma acrimónia que junta gasolina à fogueira. Pelo lado dos meus crê-se que se está perante uma ligação contra-natura – seja lá isso o que for – pelo facto de não ser concebível a coligação de políticas de esquerda com as vontades sociais dos eleitos pela direita. Apertados por esta lógica de difícil refutação os apoiantes da coligação vencedora partem para agressões verbais desnecessárias.

Sumariado o evento tentemos uma abordagem mais serena da questão.

Já foi mil vezes repetidos e se-lo-á até à exaustão terem as eleições autárquicas um cariz diferente de quaisquer outras. E bem que eu pense que todas as eleições são distintas umas das outras, dependendo quer do órgão a ser eleito, quer da especial conjuntura em que ocorrem ou ocorrerão, aceitemos pelo seu valor facial, para facilidade de exposição, este enunciado. A principal característica diferenciadora destas eleições seria a da extrema personalização dos candidatos. Efectivamente, a prática tem demonstrado que existe forte mutabilidade na vontade dos eleitores, os quais, tantas vezes, nestas circunstâncias, trocam o voto ideológico pelo voto afectivo.

Aceite este princípio salta aos olhos que a inelutável vencedora destas autárquicas, no Concelho do Barreiro, foi a CDU. Não só a população lhe outorgou claramente a vitória, como lhe concedeu a maioria absoluta na Câmara, e lhe proporcionou maiorias confortáveis ou absolutas em muitos outros órgãos autárquicos. Ninguém, de boa-fé, poderá pôr em causa o claro sentido do voto da população. O corolário desta situação é que, descendo genericamente a votação em todos os restantes partidos e, consolidando-se ou subindo na CDU, esta está armada de uma legitimidade intransponível.

Ultrapassando a posição pessoal de esperar que um dia a maioria sociológica de esquerda se transforme em política, bem como de considerar como perigosa qualquer maioria absoluta, de qualquer partido, em qualquer órgão de soberania, resta-me aceitar, a contra gosto que seja, que os eleitores deste concelho, declararam sem rebuços, o apoio às políticas seguidas e propostas pela autarquia.

Dessa política fazia parte a repartição de Pelouros com o Vereador, Bruno Vitorino, eleito pelo PSD e com o Vereador João Soares, PS, que aceitou o cargo à revelia da posição assumida pelo seu partido. Pelo discurso do Presidente Carlos Humberto, na tomada de posse, presume-se que nesta Câmara se irão manter os pressupostos anteriores. Ressalte-se que tendo obtido a maioria absoluta poderia a CDU fechar a vereação nos eleitos pela sua coligação e, não o fazendo, deve salientar-se a abertura democrática desta acção do Presidente Carlos Humberto.

Não havendo novidades nesta área, até porque ao BE não foi possível eleger um vereador, fica a situação das “perigosas ligações” nas freguesias.

Este ponto de vista parece-me enfermar de uma falta de lógica de continuidade. Se a Câmara disponibilizou um lugar, é certo que exigindo solidariedade institucional, ao eleito do PSD, porque é que não o poderia fazer nas Juntas de Freguesia? Parece-me óbvio que nenhum impedimento sério se pode colocar quanto à justeza desta posição. Os eleitos de qualquer partidos são, quanto a mim, pessoas estimáveis, com as quais convivemos no dia-a-dia e que, tal como nós procuram, dentro da sua perspectiva, o bem destas populações. Poderão objectar que, a nível da Assembleia da República o panorama será bem distinto. É bem verdade que aí, iremos ver, por coincidência de propostas, muitas vezes o Bloco a votar com a CDU e contra o PSD. Só que, tendo isto em vista, não é lícito aos meus camaradas derivarem estes comportamentos a nível nacional, como espelhamento de escolhas ao nível local. O Barreiro, por razões certamente históricas, tem a peculiaridade, várias vezes demonstrada, de as estruturas locais mostrarem uma independência notória em relação às directivas nacionais dos partidos. Veja-se, como exemplo, as posições sobre a Terceira Travessia do Tejo. É bastante ilustrativa e penso não ser necessário trazer mais factos à colação.

Assim sendo, dada a personalização do voto e a desiologização do mesmo, quem é escolhido para o órgão autárquico será, eventualmente, mais a pessoa que o membro do partido. São estes dois elementos que podem explicar as escolhas da CDU. Dever-se-á acrescentar mais um elemento, este sim partidário, que é o do PSD, pelas suas características, não ameaçar o terreno político da CDU e do Bloco, pelo mesmo motivo, pescar nas mesmas águas o que introduz um elemento agonístico na equação. É portanto aceitável que as escolhas havidas só possam ter sido as que foram.

Como não se faz um casamento sem a livre vontade dos nubentes, não deverão os meus camaradas de partido ficar enfadados por terem sido preteridos nas escolhas. É compreensível, pelos factos aduzidos que o tenham sido. Até me parece que tal exclusão é laudatória e deverá motivar a continuidade dos nossos esforços apresentando à população a bondade das nossas acções e programas. Se o soubermos fazer, e relembro que uma eleição se começa a ganhar no primeiro dia do novo mandato e não na campanha eleitoral, os resultados virão naturalmente. Os nossos pontos de vista são, necessariamente, diferentes dos da CDU. Não deveremos pois esperar benesses e facilidades por parte desta coligação, independentemente da qualidade das relações pessoais, devendo sim, demonstrar com clareza as nossas propostas e, como oposição legítima, apresentar, caso a caso, em que se diferenciam e se tornam mais positivas para a população, as propostas e acções que empreenderemos em todos os órgãos em que estamos representados.

O poder autárquico foi estruturado, nos inícios de Abril, com os partidos então colocados nos órgãos de poder. Não será fácil agilizar esta estrutura muito solidificada mas é possível e é esse o trabalho que nos espera. Menos agastamento com escolhas que não nos pertencem e mãos à obra, Camaradas.


Publicado in “Rostos on line” – http://rostos.pt

Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado por Carlos Alberto Correia às 13:31

In illo tempore, Saramago

Sexta-feira, 23.10.09
id="BLOGGER_PHOTO_ID_5395599367856672322" />



Nota-se, por vezes, que na voz restante da Igreja, reside uma saudade imensa da força que teve o poder excomungante que lhe permitia calar todas as vozes insubmissas ao seu dizer “paternal”. Mais ainda, fica realmente perturbada quando o que é dito, vem de alguém cujo brado possa ser escutada e a confronte, racionalmente, com a irracionalidade do produto que coloca no mercado. Um mercado, diga-se, onde a concorrência é cada vez maior e o peso burocrático da sua máquina a impede de agir com a agilidade necessária à conquista das almas transviadas por outras seduções religiosas ou profanas. Defende-se, portanto, com a outra face da burocracia: o peso da Instituição. Entende, por isso, que quem lhe não veste o dogma, deve-se calar. O contrário será, como afirmaram várias fontes da Igreja perante este caso, ser pouco sério e ignorante.

O Vaticano, que desde o Evangelho Segundo Jesus Cristo, traz um saramago atravessado na garganta, agravado pelas declarações feitas em Roma, há poucos dias, nas quais o escritor apodava de cínico o Cardeal Ratzinger - actual Papa Bento XVI e anterior Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé - veio, prontamente afirmar que não daria nenhuma importância ao caso conferindo-lhe, de imediato, toda a importância que pretenderia negar-lhe.

As afirmações desempoeiradas de Saramago, sobre a Bíblia, no lançamento do seu novo livro Caim, fizeram soltar na praça a ira persecutória do porta-voz da Conferência episcopal, Manuel Morujão, a arrogância de um ou outro teólogo de maior ou menor nomeada, bem como uma revoada de gente bem pensante cujo confessado desejo seria o de eliminar a fonte de tal perturbação.

Tentando discorrer com alguma serenidade no meio de tanta comoção apraz-me perguntar o que é a Bíblia? Escrito fundamental para a fundação da nossa matriz cultural, não duvido. Palavra de Deus oferecida aos mortais para seu esclarecimento e guia de vida? Vão falar com outros meninos!

As narrativas bíblicas são recolhas de mitos existentes em tradições orais e escritas de várias religiões e regiões do médio oriente, escolhidas e modificadas, de acordo com interesses e actualizações vários, ao longo dos tempos. É um edifício simbólico, não um manual de conhecimentos como os fundamentalistas querem fazer crer. Se não devemos julgar os actos descritos com os olhos morais deste tempo, também não podemos, sem prejuízo de soltar todas as crendices derrotadas pelo conhecimento, aceitar acriticamente o relato bíblico. Deverá ser encarado como um reconto de um dado momento da humanidade, com as suas grandezas e misérias, ajustado às necessidades de unificar um povo – os Hebreus – desunidos por nomadizações e guerras contínuas. A dureza e crueldade existentes no Deus bíblico é a imagem das forças necessárias para a unificação de Israel e para a derrota dos seus inimigos locais. Fazer disto o padrão moral para a nossa época é, no mínimo, risível. Mesmo há dois mil anos, o padrão já estava de tal modo ultrapassado que Cristo teve de subverter o paradigma bíblico para provocar uma mudança cultural. Transformou o terrível deus da ira em deus do amor, não conseguindo, no entanto, ultrapassar todas as contradições que essa revisão provocou. O resultado foi a ortodoxia religiosa usar o seu poder para exigir e causar a sua morte.

A Igreja, como detentora da”verdade única”, tem uma génese autocrática de que não se consegue desligar. Democracia é um conceito estranho para um corpo de sacerdotes profissionais para quem o máximo bem está no fortalecimento da sua corporação e na manutenção da diferenciação hierárquica. Que o façam em nome de um deus ou de uma qualquer outra força é irrelevante. Por isso vamos encontrar as religiões dominante sempre do lado dos poderosos e utilizadas como forças de subjugação terrena sob promessas de um bem maior a ser outorgado num qualquer paraíso posterior. São estas as ocorrências que levam a um confronto rude sempre que o progresso tenta dar um passo que seja. Por isso as igrejas são, por norma, científica e socialmente reaccionárias. O terreno que a ciência ganha perde-o sempre a crença obscurantista, para grande incomodidade dos que com esta aproveitam.

Que os próceres da Igreja tenham vindo bramar sem rebuços contra as imprecações anti-blíblicas de um ateu confessado admira-me muito quando, por estes dias, várias igrejas católicas, na América, declaram falência, num movimento sem precedentes e desgostante, com o fito de evitar pagar as indemnizações devidas, por condenação em tribunal dos seus agentes, por actos de pedofilia praticados no decorrer e com a força do seu múnus apostólico.

Senhores Cardeais, senhores Bispos, senhores Padres, para onde se escapuliu, nestes casos, a vossa indignada voz? Por favor, deixem de pretender dar lições de moral ao mundo e tratem de limpar o que de podre vai no vosso reino. Lembrai-vos que o Mestre, que dizeis seguir, afirmava ser mais fácil reparar no argueiro que entrou no olho do vizinho que aperceberem-se da trave que vos habita o olhar.


Publicado in “Rostos on line” – http://rostos.pt

Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado por Carlos Alberto Correia às 01:18

Memórias XVIII – trago um país

Sexta-feira, 09.10.09
id="BLOGGER_PHOTO_ID_5390560704999546146" />
Foto de BlueShell

trago comigo
um país achado em Portugal
trago um país meu
por final

trago comigo um país de mel e poesia
um país de vinho
um país amargo
trago um país que há muito não havia
e que foi encontrado ao largo
de si mesmo

trago um país repartido a esmo
um país vizinho e longe
em vento e tortura abandonado
num país de novo construído
de novo este país foi encontrado

levo comigo um país de tempos idos
um país que não volta
sem saudades
trago num sorriso à rédea solta
um país que me fala de verdades

digo trigo e pão e primavera
o sol nasce
digo tempo era
e hoje faz-se
o país que em mim trago ousadamente

tenho uma pátria trago um país agora
enormemente



Lisboa, Primavera de 1974

Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado por Carlos Alberto Correia às 11:26

O Bloco, segundo Bruno Vitorino

Quinta-feira, 01.10.09
id="BLOGGER_PHOTO_ID_5387657050152858146" />
Confessando a minha simpatia pelas pessoas do Vereador Bruno Vitorino e do candidato à Câmara Municipal Nuno Banza e, a título meramente pessoal, não posso deixar de tecer breves comentários às afirmações produzidas pelo primeiro, dadas à luz na edição “on-line” do Rostos de 30 de Setembro, a propósito, ou a despropósito, do Bloco de Esquerda.

Aponta Bruno Vitorino as suas baterias dizendo não ter o Bloco de Esquerda feito o trabalho de casa e de não ter ideias para o Barreiro. Como a notícia não esclarece mais não sei a que trabalhos, que devessem ter sido feitos e não o foram, se refere o Vereador. Se, no entanto se quiser esclarecer basta dar-se ao trabalho de “folhear “ o Rostos e depressa de aperceberá das intervenções do Bloco nos órgão políticos onde tem representação e na sociedade em geral, durante todo o tempo e não apenas em períodos eleitorais, feitas no e sobre o Barreiro. Espero que reflicta e não queira entrar naquela categoria do “pior cego é o que não quer ver”.

A afirmação de não ter o Bloco ideias para o Barreiro é arrogante e simplista. Arrogante porque pressupõe o princípio erróneo de que a inteligência e esclarecimento são património exclusivo de um homem ou de um partido; simplista porquanto parte da noção de o que não vê ou não sabe é pura inexistência. Esta é uma posição muito restrita e paroquial que é perigosa para quem se propõe ao governo dos homens.

Por outro lado, como afirma o candidato Nuno Banza, não será muito curial que os simpatizantes do Bloco venham a votar PSD, ou vice-versa. Se o amor à democracia nos une, muita coisa sobre a forma de a pôr em prática nos separa. Por isso, por aí, não virá grande perigo para qualquer dos partidos. Então porquê esta incomodidade que o Bloco de Esquerda parece suscitar em Bruno Vitorino que o leva a querer evidenciar, estraçalhando a realidade, miríficas incapacidades do Bloco?

Só uma resposta me parece plausível. No Concelho do Barreiro o Bloco teve uma votação superior à obtida pelo PSD. O receio sustentado de que, a manter-se este resultado, perca o PSD o seu vereador a favor do Bloco é a real substância de tais afirmações. Não duvido que o temor seja legítimo mas, para bem de todos, devemos dignificar a política não recorrendo a este tipo de argumentos infundados, desprestigiantes para quem os utiliza. Façamos, isso sim, uma política informada, baseada no desejo das melhores soluções para a Cidade, consultando com boa-fé as propostas dos adversários e a bondade dos seus programas, criticando as verdadeiras ineficácias ou as reais actividades que desmereçam o proposto.

Se o não conhecer terei todo o gosto em enviar-lhe o programa autárquico do Bloco de Esquerda do Barreiro, para que consigo não se passe o que se passou com a sua líder nacional a qual, por semelhante arrogância, também não reconhecia nos outros a existência de programas e ideias capazes de pensar e renovar o país.

Veja o resultado que deu!

Publicado in “Rostos on line” – http://rostos.pt

Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado por Carlos Alberto Correia às 15:38