O que é isso da governabilidade?
Sexta-feira, 26.06.09
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Desde que Paulo Rangel venceu Sócrates nas Europeias, a Direita acordou! Mas despertou receosa de que, no próximo confronto, tal espavento não se repita e os partidos de esquerda voltem a somar a maioria absoluta dos votos expressos. Para que tal não aconteça é necessário agitar alguns papões ameaçadores .O bloco de direita – PSD, CDS a que , pelas suas recentes posições, é licito juntar o Presidente da República – está unido em torno de três ideias básicas as quais, sendo puros mitos, pretendem simular verdades absolutas: a da governabilidade, a da simultaneidade das eleições legislativas e autárquicas e a da economia por corte das grandes obras públicas.
A primeira questão é apresentada como se qualquer unidade pós-eleitoral só fosse possível à direita. Espera-se que o PSD ganhe as legislativas e componha a maioria com o CDS ou, cereja em cima do bolo, que o bloco central de interesses económicos venha a traduzir-se num bloco central da política unindo PSD e o PS. Por outro lado, na esquerda apenas pressentem impossibilidades. O PS nunca uniria esforços com o PCP e, muito menos ainda com, dizem eles, o imaturo Bloco de Esquerda. A pergunta a fazer-se é porquê? Que fatalidade genética dará aos partidos de direita maior capacidade ou apetência para a governação e as retira às esquerdas? Em que tratado de Política, ou de Biologia, tal se demonstra? Já se esqueceram de Durão Barroso, do seu pântano e do precipitado abandono do governo para rumar à sinecura europeia, deixando pendurados os portugueses, entre eles, oh! Ironia, a ministra Ferreira Leite mais o seu doloroso programa de emagrecimento da população? Já estamos esquecidos que as acções governativas da direita são aquelas que conduziram o mundo às guerras e a esta crise? Mais liberalismo sem freio? Mais mercado a dirigir os destinos do mundo sob a lenda da auto regulação, quando sabemos que o seu objectivo é sempre explorar, até ao limite e sem ética, todas as possibilidades? Esquecendo que o seu único objectivo é a máxima acumulação de riqueza, num exíguo número de empresas ou pessoas, e quando os limites são atingidos abandonando as populações empobrecidas aos problemas por eles criados na ânsia louca de um desmedido enriquecimento?
Temos de tornar claro que a acção comum das esquerda é uma possibilidade. Perante propostas e políticas concretas, que defendam as populações trabalhadoras, qualquer dos partidos de esquerda pode, e muitas vezes já foi feito, juntar as suas vozes e votos para tornar possível o melhoramento da vida da nossa gente.
A segunda ideia-força é a da simultaneidade das eleições. O grande argumento é a poupança feita se as eleições decorrerem no mesmo dia. Se os argumentos forem somente os de índole económica, na fronteira, chegaremos à denegação da democracia porque, aparentemente é mais cara que qualquer regime de quero, posso e mando. Na realidade apenas o PSD defende eleições simultâneas. Fá-lo, sejamos claros,porque lhes parecem ser mais favoráveis aos seus desígnios, porque pensa optimizar assim os seus resultados eleitorais. Todos os outros partidos preferem eleições desligadas. Será porque são mais perdulários que o PSD? Claro que não! Também aqui se joga o interesse próprio de cada partido. No entanto há algo mais a juntar a esta posição. Cada eleição tem a sua dignidade e o seu espaço próprio. Misturá-las, não sendo crime de lesa democracia, é sem dúvida subalternizar uma em relação à outra. Ora isto seria um mau serviço, a longo prazo, à democracia. Seria como cortar na comida e ficar admirado por se ter fome. Não me parece, à primeira vista, que devamos submeter-nos à ilusão económica prestando, nesse passo, um péssimo serviço à democracia.
Finalmente a grande preocupação com a dívida, resolúvel no corte dos investimentos com as obras públicas, faze-me lembrar lágrimas de crocodilo. Que é preocupante a subida do endividamento, claro que é! Todos o sabemos. Mas serão todas as dívidas iguais? O endividamento ao jogo é semelhante ao investimento numa máquina para produção? O que se deve discutir não é se vamos gastar muito dinheiro, mas sim o que poderemos ganhar com esse gasto. Desta discussão foge a direita preferindo a facilidade de um economicismo parvo. No entanto, sabemos que, caso ganhasse as eleições, algumas destas agora contestadas obras teriam que ser feitas. O aeroporto de Lisboa é um enorme risco. Tem-nos valido Nossa Senhora de Fátima ou dos aviões senão já uma aeronave se teria esmagado sobre o casario lisboeta. O aeroporto está cercado pela cidade e terá, inevitavelmente de ser mudado. Como está decidido ser em Alcochete, teriam de construir-se acessos e, lamentando ter de dar o braço a torcer, lá viria a direita dizer que afinal a ponte era necessária. Só que num outro local onde servisse melhor a sua clientela e não nestas zonas demasiado vermelhas para o seu requintado gosto. E o TGV? Claro, com o impulso que a direita, em boa hora eleita, daria ao mercado, seria necessário um meio de transporte expedito para que os homens de negócio pudessem, sem perdas de tempo, encontrar-se em qualquer ponto da Ibéria. Lá viria o comboio rápido solucionar parte do problema. Pareço demasiado cínico na minha exposição? Olhem que não! Na verdade esta súbita moderação da direita não é real. É meramente estratégica. Visa assustar para dominar. Afinal quem é que, em primeiro lugar, beneficia dos grandes empreendimentos senão as grandes empresas? E de quem são eles apoiantes? Do Bloco, não! Do PCP, tão pouco! Do PS, às vezes quando faz o jogo liberal. Do bloco de direita? Certamente e sem qualquer dúvida.
Então, sabendo isto, não nos deixemos embalar em cantos de sereia a vamos, frontalmente, recusar os receios que a direita tenta injectar na vontade dos portugueses e dizer claramente que a maioria é o povo e que o povo espera uma esquerda que não se traia nem o traia. Desta forma poderemos fazer frente à crise e ultrapassá-la em benefício dos que diariamente labutam com um mínimo de réditos.
Não podemos esperar que resolvam a crise aqueles que a criaram.
Publicado in “Rostos on line” – http://rostos.pt
Desde que Paulo Rangel venceu Sócrates nas Europeias, a Direita acordou! Mas despertou receosa de que, no próximo confronto, tal espavento não se repita e os partidos de esquerda voltem a somar a maioria absoluta dos votos expressos. Para que tal não aconteça é necessário agitar alguns papões ameaçadores .O bloco de direita – PSD, CDS a que , pelas suas recentes posições, é licito juntar o Presidente da República – está unido em torno de três ideias básicas as quais, sendo puros mitos, pretendem simular verdades absolutas: a da governabilidade, a da simultaneidade das eleições legislativas e autárquicas e a da economia por corte das grandes obras públicas.
A primeira questão é apresentada como se qualquer unidade pós-eleitoral só fosse possível à direita. Espera-se que o PSD ganhe as legislativas e componha a maioria com o CDS ou, cereja em cima do bolo, que o bloco central de interesses económicos venha a traduzir-se num bloco central da política unindo PSD e o PS. Por outro lado, na esquerda apenas pressentem impossibilidades. O PS nunca uniria esforços com o PCP e, muito menos ainda com, dizem eles, o imaturo Bloco de Esquerda. A pergunta a fazer-se é porquê? Que fatalidade genética dará aos partidos de direita maior capacidade ou apetência para a governação e as retira às esquerdas? Em que tratado de Política, ou de Biologia, tal se demonstra? Já se esqueceram de Durão Barroso, do seu pântano e do precipitado abandono do governo para rumar à sinecura europeia, deixando pendurados os portugueses, entre eles, oh! Ironia, a ministra Ferreira Leite mais o seu doloroso programa de emagrecimento da população? Já estamos esquecidos que as acções governativas da direita são aquelas que conduziram o mundo às guerras e a esta crise? Mais liberalismo sem freio? Mais mercado a dirigir os destinos do mundo sob a lenda da auto regulação, quando sabemos que o seu objectivo é sempre explorar, até ao limite e sem ética, todas as possibilidades? Esquecendo que o seu único objectivo é a máxima acumulação de riqueza, num exíguo número de empresas ou pessoas, e quando os limites são atingidos abandonando as populações empobrecidas aos problemas por eles criados na ânsia louca de um desmedido enriquecimento?
Temos de tornar claro que a acção comum das esquerda é uma possibilidade. Perante propostas e políticas concretas, que defendam as populações trabalhadoras, qualquer dos partidos de esquerda pode, e muitas vezes já foi feito, juntar as suas vozes e votos para tornar possível o melhoramento da vida da nossa gente.
A segunda ideia-força é a da simultaneidade das eleições. O grande argumento é a poupança feita se as eleições decorrerem no mesmo dia. Se os argumentos forem somente os de índole económica, na fronteira, chegaremos à denegação da democracia porque, aparentemente é mais cara que qualquer regime de quero, posso e mando. Na realidade apenas o PSD defende eleições simultâneas. Fá-lo, sejamos claros,porque lhes parecem ser mais favoráveis aos seus desígnios, porque pensa optimizar assim os seus resultados eleitorais. Todos os outros partidos preferem eleições desligadas. Será porque são mais perdulários que o PSD? Claro que não! Também aqui se joga o interesse próprio de cada partido. No entanto há algo mais a juntar a esta posição. Cada eleição tem a sua dignidade e o seu espaço próprio. Misturá-las, não sendo crime de lesa democracia, é sem dúvida subalternizar uma em relação à outra. Ora isto seria um mau serviço, a longo prazo, à democracia. Seria como cortar na comida e ficar admirado por se ter fome. Não me parece, à primeira vista, que devamos submeter-nos à ilusão económica prestando, nesse passo, um péssimo serviço à democracia.
Finalmente a grande preocupação com a dívida, resolúvel no corte dos investimentos com as obras públicas, faze-me lembrar lágrimas de crocodilo. Que é preocupante a subida do endividamento, claro que é! Todos o sabemos. Mas serão todas as dívidas iguais? O endividamento ao jogo é semelhante ao investimento numa máquina para produção? O que se deve discutir não é se vamos gastar muito dinheiro, mas sim o que poderemos ganhar com esse gasto. Desta discussão foge a direita preferindo a facilidade de um economicismo parvo. No entanto, sabemos que, caso ganhasse as eleições, algumas destas agora contestadas obras teriam que ser feitas. O aeroporto de Lisboa é um enorme risco. Tem-nos valido Nossa Senhora de Fátima ou dos aviões senão já uma aeronave se teria esmagado sobre o casario lisboeta. O aeroporto está cercado pela cidade e terá, inevitavelmente de ser mudado. Como está decidido ser em Alcochete, teriam de construir-se acessos e, lamentando ter de dar o braço a torcer, lá viria a direita dizer que afinal a ponte era necessária. Só que num outro local onde servisse melhor a sua clientela e não nestas zonas demasiado vermelhas para o seu requintado gosto. E o TGV? Claro, com o impulso que a direita, em boa hora eleita, daria ao mercado, seria necessário um meio de transporte expedito para que os homens de negócio pudessem, sem perdas de tempo, encontrar-se em qualquer ponto da Ibéria. Lá viria o comboio rápido solucionar parte do problema. Pareço demasiado cínico na minha exposição? Olhem que não! Na verdade esta súbita moderação da direita não é real. É meramente estratégica. Visa assustar para dominar. Afinal quem é que, em primeiro lugar, beneficia dos grandes empreendimentos senão as grandes empresas? E de quem são eles apoiantes? Do Bloco, não! Do PCP, tão pouco! Do PS, às vezes quando faz o jogo liberal. Do bloco de direita? Certamente e sem qualquer dúvida.
Então, sabendo isto, não nos deixemos embalar em cantos de sereia a vamos, frontalmente, recusar os receios que a direita tenta injectar na vontade dos portugueses e dizer claramente que a maioria é o povo e que o povo espera uma esquerda que não se traia nem o traia. Desta forma poderemos fazer frente à crise e ultrapassá-la em benefício dos que diariamente labutam com um mínimo de réditos.
Não podemos esperar que resolvam a crise aqueles que a criaram.
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Memórias XV – Momento
Quarta-feira, 17.06.09
id="BLOGGER_PHOTO_ID_5348415461055377746" />
Eu hoje vi o mar, não estava azul
era branco como o sol da manhãzinha
falavam-me as ondas por enigmas
e as vagas estendiam-se, estendiam-se…
Que faz andar as ondas, perguntei…
uma gaivota que voava contra o vento fechou as asas
e veio cair flecha ao pé de mim.
Eu vi que quem fez cair a gaivota, fazia mover o mar
Porém, não acredito num deus que tudo faz.
Se ele existisse a gaivota não morria
e porque havia ele de mexer o mar
o mar quando parado é um espelho
é assim que o sol gosta dele e no verão o quer queimar
Então o que faz mover as ondas? Outras ondas.
Que fez cair a gaivota? As asas.
Não há causa primeira. Só efeitos
das nossas causas.
É por isso que a saudade que tenho não é mística
é por isso que a dor que sentimos é só nossa
é por isso que o amor, para terceiros, é sempre estúpido
é por isso que as flores nascem de flores
é por isso que eu estou aqui e tu ali
é por isso, é por isso, é por isso
que não descubro o princípio nem o fim.
Algarve, Fevereiro, 1966
Eu hoje vi o mar, não estava azul
era branco como o sol da manhãzinha
falavam-me as ondas por enigmas
e as vagas estendiam-se, estendiam-se…
Que faz andar as ondas, perguntei…
uma gaivota que voava contra o vento fechou as asas
e veio cair flecha ao pé de mim.
Eu vi que quem fez cair a gaivota, fazia mover o mar
Porém, não acredito num deus que tudo faz.
Se ele existisse a gaivota não morria
e porque havia ele de mexer o mar
o mar quando parado é um espelho
é assim que o sol gosta dele e no verão o quer queimar
Então o que faz mover as ondas? Outras ondas.
Que fez cair a gaivota? As asas.
Não há causa primeira. Só efeitos
das nossas causas.
É por isso que a saudade que tenho não é mística
é por isso que a dor que sentimos é só nossa
é por isso que o amor, para terceiros, é sempre estúpido
é por isso que as flores nascem de flores
é por isso que eu estou aqui e tu ali
é por isso, é por isso, é por isso
que não descubro o princípio nem o fim.
Algarve, Fevereiro, 1966
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Segunda-feira, 08.06.09
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Há, na história, momentos cruciais que prenunciam mudanças até aí pouco discerníveis. Há também desenvolvimentos irónicos só entendíveis na invenção de um deus perverso entretido a baralhar os juízos dos homens ou, mais na teoria do Caos, se compreendermos que efeitos inesperados eram perfeitamente previsíveis e fatais, só não sendo apercebidos como tais por não conseguirmos apreender todas as diversas e subtis causalidades as quais, somadas, os tornaram inevitáveis.
Estas eleições europeias serão, possivelmente e a meu ver, um desses inopinados fenómenos.
Os partidos socialistas no poder, todos enfeudados, contranatura, à defesa e execução de modelos de governação neoliberal, foram castigados pelo seu desvio direitista. Os eleitores socialistas não votaram neles porque não se reconhecem nestas políticas, os liberais, sentindo-os estranhos e de pouca confiança, agradecendo o serviço prestado, preferiram voltar aos partidos que melhor e mais abertamente defendem o seu ideário. Deste modo, apesar das sucessivas mentiras e traições os socialistas neoliberais, no primeiro momento de tira-teimas, encontraram-se em terra de ninguém e com as hostes, que consideravam conquistadas, a dizerem-lhes claramente que ninguém confia em vira-casacas ideológicos.
Foi o que se viu por essa Europa fora acrescentado do quanto de desprezo, na recusa de comparência às urna, de parte significativa da população. Temos portanto os governos socialistas a pagar o preço da crise alimentada pelos neoliberais e estes, alterando agora o discurso, prometem uma regulação que não pensam implementar, aparecendo como a esperança de mudança de paradigma. Ironia das ironias espera-se que os responsáveis pela crise nos venham salvar dessa mesma crise. Ou dito de outra maneira, como se o ingénuo cordeiro fosse à toca do leão pedir-lhe protecção para os ataques desse mesmo leão.
Postos estes prolegómenos olhemos para Portugal.
De parabéns está Paulo Rangel porque, abandonado pelo baronato do partido, se bateu sozinho e com coragem, conseguindo um resultado que é, só por si, um sério aviso a Sócrates e à sua governação. O PSD, no geral, recebeu um brinde que se calhar não mereceria e que penso, será de mais difícil repetição nas Legislativas. Não duvidando que boa parte das deslocações de votos foram acções de protesto contra o Governo, é incerto que, num mano-a-mano entre Ferreira Leite e Sócrates, aquela possa levar a melhor. É que, para além do seu parco envolvimento emotivo com os eleitores também ela tem, desde o seu ministério das finanças, telhados de vidro. O resultado obtido por Rangel não será facilmente transferível para o partido no terreno das legislativas.
Por outro lado, e lá vão contas de merceeiro, a esquerda sociológica é ainda claramente maioritária. Somando canhestramente os votos do PS, Bloco e PCP, andaremos pelos 49% dos votos expressos. Seria confortável maioria se a palavra esquerda tivesse validade intrínseca e não escondesse rivalidades assassinas. Serve aqui, como reflexão, o processo exemplar que decorre, desde há dez anos, no Bloco de Esquerda. Ultrapassando as desinteligências graves que dividiam vários grupos, ditos de esquerda radical, foi possível construir uma plataforma de entendimento, através de programas e acções comuns, privilegiando o que une e ultrapassando o que separa. A pergunta que me faço é a de saber se o mesmo será possível fazer com esta agregação meramente sociológica que são os partidos do povo de esquerda?
Os tempos que aí vêm não vão ser fáceis. O brilho destas vitórias eleitorais cedo se embaciará frente às dificuldades a que iremos ser sujeitos. O tempo das facilidades – para nós recentes e breves – acabou. A globalização, que num primeiro momento acrescentou riquezas às sociedades desenvolvidas, está agora a reclamar o pagamento das facturas. Uma cada vez maior parte da população mundial, até há pouco afastada das benesses e malefícios do consumo exige, agora e com veemência, a sua quota-parte do bolo. Só que o bolo, ao ser dividido por mais gente, será não só escasso, como as suas fatias terão de ser, necessariamente, bem menores. As sociedades ocidentais não sabem conviver com isto. Inventaram a social-democracia quando era fácil transferir a exploração proletária da sua população para as colónias e ex-colónias. Acabada a mama os malefícios do desemprego, pobreza e doença espreitam novamente à porta daqueles que já se desabituaram de tais coisas e as vêm aparecer de novo como ameaça constante e inultrapassável. Para estes males não há soluções no “mercado livre” que os alimenta. Este procura apenas a maximização dos lucros e não tem preocupações humanitárias. Para ele o homem é mero factor económico e não a razão de ser da economia. Trocaram os factores da equação e a resposta só pode estar errada. Cabe às esquerdas a correcção deste estado anómalo de coisas. Mas para isso terá que encontrar-se no terreno da união, com a generosidade de tentar perceber o projecto do outro e a inteligência de ser capaz de se adaptar a uma causa comum para benefício de todos. É necessário perceber que a razão não está toda no mesmo sítio e que é essencial conseguir ceder para, em conjunto, se poder avançar. Olhando para o estado das coisas não creio que tal possa ser já uma conquista ou uma consequência destas eleições ou do que elas prenunciam. Tenho pena que ainda se vão queimar inutilmente muitas ilusões e energias antes de podermos congregar esforços para a prossecução de um mundo onde a pobreza seja erradicada e a condição humana atinja a dignidade que lhe cabe. Sei, no entanto, que esse é o caminho e para ele laborarei. Um dia, os homens de boa vontade, deixarão as divisões inconsequentes e unir-se-ão para o que é primordial e importante. Assim o espero, assim o quero e para tal trabalharei sabendo que não estou isolado nos meus esforços. Se alcançarmos estes desígnios os nossos filhos poderão crescer em paz. Caso contrário talvez eles não possam conhecer os seus netos.
Publicado in “Rostos on line” – http://rostos.pt
Há, na história, momentos cruciais que prenunciam mudanças até aí pouco discerníveis. Há também desenvolvimentos irónicos só entendíveis na invenção de um deus perverso entretido a baralhar os juízos dos homens ou, mais na teoria do Caos, se compreendermos que efeitos inesperados eram perfeitamente previsíveis e fatais, só não sendo apercebidos como tais por não conseguirmos apreender todas as diversas e subtis causalidades as quais, somadas, os tornaram inevitáveis.
Estas eleições europeias serão, possivelmente e a meu ver, um desses inopinados fenómenos.
Os partidos socialistas no poder, todos enfeudados, contranatura, à defesa e execução de modelos de governação neoliberal, foram castigados pelo seu desvio direitista. Os eleitores socialistas não votaram neles porque não se reconhecem nestas políticas, os liberais, sentindo-os estranhos e de pouca confiança, agradecendo o serviço prestado, preferiram voltar aos partidos que melhor e mais abertamente defendem o seu ideário. Deste modo, apesar das sucessivas mentiras e traições os socialistas neoliberais, no primeiro momento de tira-teimas, encontraram-se em terra de ninguém e com as hostes, que consideravam conquistadas, a dizerem-lhes claramente que ninguém confia em vira-casacas ideológicos.
Foi o que se viu por essa Europa fora acrescentado do quanto de desprezo, na recusa de comparência às urna, de parte significativa da população. Temos portanto os governos socialistas a pagar o preço da crise alimentada pelos neoliberais e estes, alterando agora o discurso, prometem uma regulação que não pensam implementar, aparecendo como a esperança de mudança de paradigma. Ironia das ironias espera-se que os responsáveis pela crise nos venham salvar dessa mesma crise. Ou dito de outra maneira, como se o ingénuo cordeiro fosse à toca do leão pedir-lhe protecção para os ataques desse mesmo leão.
Postos estes prolegómenos olhemos para Portugal.
De parabéns está Paulo Rangel porque, abandonado pelo baronato do partido, se bateu sozinho e com coragem, conseguindo um resultado que é, só por si, um sério aviso a Sócrates e à sua governação. O PSD, no geral, recebeu um brinde que se calhar não mereceria e que penso, será de mais difícil repetição nas Legislativas. Não duvidando que boa parte das deslocações de votos foram acções de protesto contra o Governo, é incerto que, num mano-a-mano entre Ferreira Leite e Sócrates, aquela possa levar a melhor. É que, para além do seu parco envolvimento emotivo com os eleitores também ela tem, desde o seu ministério das finanças, telhados de vidro. O resultado obtido por Rangel não será facilmente transferível para o partido no terreno das legislativas.
Por outro lado, e lá vão contas de merceeiro, a esquerda sociológica é ainda claramente maioritária. Somando canhestramente os votos do PS, Bloco e PCP, andaremos pelos 49% dos votos expressos. Seria confortável maioria se a palavra esquerda tivesse validade intrínseca e não escondesse rivalidades assassinas. Serve aqui, como reflexão, o processo exemplar que decorre, desde há dez anos, no Bloco de Esquerda. Ultrapassando as desinteligências graves que dividiam vários grupos, ditos de esquerda radical, foi possível construir uma plataforma de entendimento, através de programas e acções comuns, privilegiando o que une e ultrapassando o que separa. A pergunta que me faço é a de saber se o mesmo será possível fazer com esta agregação meramente sociológica que são os partidos do povo de esquerda?
Os tempos que aí vêm não vão ser fáceis. O brilho destas vitórias eleitorais cedo se embaciará frente às dificuldades a que iremos ser sujeitos. O tempo das facilidades – para nós recentes e breves – acabou. A globalização, que num primeiro momento acrescentou riquezas às sociedades desenvolvidas, está agora a reclamar o pagamento das facturas. Uma cada vez maior parte da população mundial, até há pouco afastada das benesses e malefícios do consumo exige, agora e com veemência, a sua quota-parte do bolo. Só que o bolo, ao ser dividido por mais gente, será não só escasso, como as suas fatias terão de ser, necessariamente, bem menores. As sociedades ocidentais não sabem conviver com isto. Inventaram a social-democracia quando era fácil transferir a exploração proletária da sua população para as colónias e ex-colónias. Acabada a mama os malefícios do desemprego, pobreza e doença espreitam novamente à porta daqueles que já se desabituaram de tais coisas e as vêm aparecer de novo como ameaça constante e inultrapassável. Para estes males não há soluções no “mercado livre” que os alimenta. Este procura apenas a maximização dos lucros e não tem preocupações humanitárias. Para ele o homem é mero factor económico e não a razão de ser da economia. Trocaram os factores da equação e a resposta só pode estar errada. Cabe às esquerdas a correcção deste estado anómalo de coisas. Mas para isso terá que encontrar-se no terreno da união, com a generosidade de tentar perceber o projecto do outro e a inteligência de ser capaz de se adaptar a uma causa comum para benefício de todos. É necessário perceber que a razão não está toda no mesmo sítio e que é essencial conseguir ceder para, em conjunto, se poder avançar. Olhando para o estado das coisas não creio que tal possa ser já uma conquista ou uma consequência destas eleições ou do que elas prenunciam. Tenho pena que ainda se vão queimar inutilmente muitas ilusões e energias antes de podermos congregar esforços para a prossecução de um mundo onde a pobreza seja erradicada e a condição humana atinja a dignidade que lhe cabe. Sei, no entanto, que esse é o caminho e para ele laborarei. Um dia, os homens de boa vontade, deixarão as divisões inconsequentes e unir-se-ão para o que é primordial e importante. Assim o espero, assim o quero e para tal trabalharei sabendo que não estou isolado nos meus esforços. Se alcançarmos estes desígnios os nossos filhos poderão crescer em paz. Caso contrário talvez eles não possam conhecer os seus netos.
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Borradas judiciais
Terça-feira, 02.06.09
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1 - Declaração de interesses
Como foi noticiado na imprensa local integro as listas do Bloco de Esquerda para as eleições autárquicas. Este facto coloca-me um problema de princípios sobre a circunstância de, sendo candidato, dever, ou não, suspender a minha colaboração temporariamente neste Jornal. Consultado o travesseiro, como é costume dizer-se, cheguei à conclusão que, alertados os leitores para o facto, conscientes da declaração de interesses, nada obstaria à continuidade da minha colaboração neste órgão informativo. Na verdade a crónica nada mais é que o exercício opinativo abordado através dos factos quotidianos ou da defesa de valores e crenças. Assim ela é por natureza e sempre um acto político por excelência.
Pesados estes critérios, não havendo nada em contrário por parte da direcção do Rostos, manterei a minha presença, acrescentando na assinatura as condições de militante e candidato pelo Bloco de Esquerda. Ficarão assim ressalvados, em meu critério, os pressupostos éticos que devem presidir à relação entre escritor e leitores.
2 – As borradas
Esmeralda, Alexandra e tantos mais casos e pessoas que não chegaram às luzes da ribalta desesperam-nos em relação ao aparelho judicativo do País. Somos um país legislativo, dificilmente um estado de direito. A justiça cara e tardia, decisões socialmente chocantes, o poder possivelmente excessivo do corpo judicial, fazem parte do descontentamento das nossas vidas.
Qualquer forma de poder, em democracia, exige de quem o receba imenso cuidado na sua utilização. Responsabilidade e humildade na execução legitimam o seu possuidor e conferem dignidade a quem, parcimoniosamente, o exerce. A arrogância e a prepotência são a outra, negativa, face do poder.
Por questões históricas e sociais há muita arrogância a impregnar o tecido judicial. Daí à decisão injusta ou desfasada da realidade é um pequeno passo que é, por demais, dado sem maior reflexão sobre os efeitos latentes da mesma.
Para ilustrar estas afirmações não resisto a contar um caso antigo, para o qual me foi pedida fundamentação antropológica, de atribuição de poder paternal.
Um casal com um bebé de cerca de um ano divorciou-se. Na divisão de bens, como era costume, concordaram na atribuição da casa à mãe factor correlato com a responsabilidade parental directa que lhe fora consignada. Só que a mãe não correspondeu às exigências inerentes. Começou por deixar o filho sozinho durante a noite e, conhecido o facto, chamada a atenção, passou a largar o filho em casa da avó paterna. Inicialmente apenas nas noites em que decidia ir divertir-se, posteriormente acrescentou os fins-de-semana e, finalmente, passando semanas inteiras em que nem sequer ia saber como estava o bebé. Entretanto, o pai que era militar, vivia nos quartéis onde prestava serviço, não podendo ter consigo um filho de tão tenra idade. Mas, para a mãe, não havia qualquer problema. Tudo corria sobre rodas.
Ia o bebé pelos seus dois anos e meio quando o pai, casando em segundas núpcias, achou-se com capacidades para dar de novo um lar ao seu filho. Muito embora o pequeno continuasse a viver, habitualmente, em casa da avó paterna, sendo respeitador da lei, pediu a revisão, em sede própria, da atribuição do poder paternal. O caso, que parecia de fácil resolução, dado o abandono a que a mãe sempre votara a criança, arrastou-se uns quatro anos pelo tribunal. Continuando ela, como se provou, a ser negligente em relação à criança, possivelmente como vingança pelo facto de o pai se ter casado novamente, retirou o seu filho de casa da avó, começando a sonegar as visitas da criança à nova família. Como consequência, ainda, da existência um tanto ou quanto desregrada perdeu a mãe o emprego e da pensão reforçada, dada pelo pai, para manutenção do filho saía parte substancial para sustento da sua vida social com prejuízo das condições de manutenção do bebé. Aviltando ainda mais a situação desta mulher acresceu a remessa para tribunal de casos de cheques sem cobertura – na altura considerados crime – bem como uma pendência qualquer, com a então Policia de Viação e Trânsito, por ilegalidade cometida. Apurou-se também que estava em vias de emigração.
Esta possibilidade levou a que o pai aumentasse a pressão sobre o tribunal. Um dia lá chegou o julgamento e tudo quanto foi dito sobre o comportamento negligente e culposo da mãe foi provado. Assim como a possível deslocação para o estrangeiro. O libelo produzido pela Juíza do caso era terrível para a mãe. Reconhecia tudo. Havia indignidade no seu comportamento, não merecia credibilidade, não obedecia às ordens emanadas pelo tribunal, por isso – quando todos pensávamos que iria ter a devida sanção - o poder parental continuaria a ser-lhe garantido!
Pasmei e aquele pai nunca mais viu o seu filho!
Este caso foi aqui trazido por me parecer bem paradigmático de uma certa forma de fazer justiça. Poderia chamar-lhe a decisão “by the book”. Isto é, a simples colagem à letra da lei, sem que haja capacidade de perceber que em casos de consequências sociais como estes, a decisão sábia será mais baseada na sociologia que no estrito cumprimento do enunciado legal. Não são simples as questões da parentalidade nem o laço biológico será sempre o mais importante critério a avaliar. A consanguinidade não é tudo. Os laços socioafectivos são, muitas vezes, bem mais importantes que os genéticos. As questões de progenitura foram importantes para as sucessões dinásticas e outras. Fazem parte de uma mitologia do sangue que a ciência hoje já não pode assumir de forma tão primária. A parentalidade é uma criação derivada do social e que só nas interligações criadas se consubstancia. Mas para efectivar esta atitude na Justiça é necessário uma outra forma de preparação, um outro entendimento da vida e das consequências de determinadas deliberações, para as quais, que me perdoem aqueles que não cabem nesta descrição, a maior parte dos nossos juízes não está preparada.
Precisamos de outra justiça. Fazem falta novos juízes! Não é possível continuar, tantas vezes, a borrar-se, desta maneira, a escrita.
Publicado in “Rostos on line” – http://rostos.pt
1 - Declaração de interesses
Como foi noticiado na imprensa local integro as listas do Bloco de Esquerda para as eleições autárquicas. Este facto coloca-me um problema de princípios sobre a circunstância de, sendo candidato, dever, ou não, suspender a minha colaboração temporariamente neste Jornal. Consultado o travesseiro, como é costume dizer-se, cheguei à conclusão que, alertados os leitores para o facto, conscientes da declaração de interesses, nada obstaria à continuidade da minha colaboração neste órgão informativo. Na verdade a crónica nada mais é que o exercício opinativo abordado através dos factos quotidianos ou da defesa de valores e crenças. Assim ela é por natureza e sempre um acto político por excelência.
Pesados estes critérios, não havendo nada em contrário por parte da direcção do Rostos, manterei a minha presença, acrescentando na assinatura as condições de militante e candidato pelo Bloco de Esquerda. Ficarão assim ressalvados, em meu critério, os pressupostos éticos que devem presidir à relação entre escritor e leitores.
2 – As borradas
Esmeralda, Alexandra e tantos mais casos e pessoas que não chegaram às luzes da ribalta desesperam-nos em relação ao aparelho judicativo do País. Somos um país legislativo, dificilmente um estado de direito. A justiça cara e tardia, decisões socialmente chocantes, o poder possivelmente excessivo do corpo judicial, fazem parte do descontentamento das nossas vidas.
Qualquer forma de poder, em democracia, exige de quem o receba imenso cuidado na sua utilização. Responsabilidade e humildade na execução legitimam o seu possuidor e conferem dignidade a quem, parcimoniosamente, o exerce. A arrogância e a prepotência são a outra, negativa, face do poder.
Por questões históricas e sociais há muita arrogância a impregnar o tecido judicial. Daí à decisão injusta ou desfasada da realidade é um pequeno passo que é, por demais, dado sem maior reflexão sobre os efeitos latentes da mesma.
Para ilustrar estas afirmações não resisto a contar um caso antigo, para o qual me foi pedida fundamentação antropológica, de atribuição de poder paternal.
Um casal com um bebé de cerca de um ano divorciou-se. Na divisão de bens, como era costume, concordaram na atribuição da casa à mãe factor correlato com a responsabilidade parental directa que lhe fora consignada. Só que a mãe não correspondeu às exigências inerentes. Começou por deixar o filho sozinho durante a noite e, conhecido o facto, chamada a atenção, passou a largar o filho em casa da avó paterna. Inicialmente apenas nas noites em que decidia ir divertir-se, posteriormente acrescentou os fins-de-semana e, finalmente, passando semanas inteiras em que nem sequer ia saber como estava o bebé. Entretanto, o pai que era militar, vivia nos quartéis onde prestava serviço, não podendo ter consigo um filho de tão tenra idade. Mas, para a mãe, não havia qualquer problema. Tudo corria sobre rodas.
Ia o bebé pelos seus dois anos e meio quando o pai, casando em segundas núpcias, achou-se com capacidades para dar de novo um lar ao seu filho. Muito embora o pequeno continuasse a viver, habitualmente, em casa da avó paterna, sendo respeitador da lei, pediu a revisão, em sede própria, da atribuição do poder paternal. O caso, que parecia de fácil resolução, dado o abandono a que a mãe sempre votara a criança, arrastou-se uns quatro anos pelo tribunal. Continuando ela, como se provou, a ser negligente em relação à criança, possivelmente como vingança pelo facto de o pai se ter casado novamente, retirou o seu filho de casa da avó, começando a sonegar as visitas da criança à nova família. Como consequência, ainda, da existência um tanto ou quanto desregrada perdeu a mãe o emprego e da pensão reforçada, dada pelo pai, para manutenção do filho saía parte substancial para sustento da sua vida social com prejuízo das condições de manutenção do bebé. Aviltando ainda mais a situação desta mulher acresceu a remessa para tribunal de casos de cheques sem cobertura – na altura considerados crime – bem como uma pendência qualquer, com a então Policia de Viação e Trânsito, por ilegalidade cometida. Apurou-se também que estava em vias de emigração.
Esta possibilidade levou a que o pai aumentasse a pressão sobre o tribunal. Um dia lá chegou o julgamento e tudo quanto foi dito sobre o comportamento negligente e culposo da mãe foi provado. Assim como a possível deslocação para o estrangeiro. O libelo produzido pela Juíza do caso era terrível para a mãe. Reconhecia tudo. Havia indignidade no seu comportamento, não merecia credibilidade, não obedecia às ordens emanadas pelo tribunal, por isso – quando todos pensávamos que iria ter a devida sanção - o poder parental continuaria a ser-lhe garantido!
Pasmei e aquele pai nunca mais viu o seu filho!
Este caso foi aqui trazido por me parecer bem paradigmático de uma certa forma de fazer justiça. Poderia chamar-lhe a decisão “by the book”. Isto é, a simples colagem à letra da lei, sem que haja capacidade de perceber que em casos de consequências sociais como estes, a decisão sábia será mais baseada na sociologia que no estrito cumprimento do enunciado legal. Não são simples as questões da parentalidade nem o laço biológico será sempre o mais importante critério a avaliar. A consanguinidade não é tudo. Os laços socioafectivos são, muitas vezes, bem mais importantes que os genéticos. As questões de progenitura foram importantes para as sucessões dinásticas e outras. Fazem parte de uma mitologia do sangue que a ciência hoje já não pode assumir de forma tão primária. A parentalidade é uma criação derivada do social e que só nas interligações criadas se consubstancia. Mas para efectivar esta atitude na Justiça é necessário uma outra forma de preparação, um outro entendimento da vida e das consequências de determinadas deliberações, para as quais, que me perdoem aqueles que não cabem nesta descrição, a maior parte dos nossos juízes não está preparada.
Precisamos de outra justiça. Fazem falta novos juízes! Não é possível continuar, tantas vezes, a borrar-se, desta maneira, a escrita.
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