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Por respeito a Angola

Sábado, 28.04.18

 

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Sabe-se, de ciência escrita e comprovada, que quando o leão novo expulsa o leão velho, a sua primeira ação é liquidar todos os filhotes do vencido. Este exemplo da Natureza ribomba-me na lembrança ao olhar os acontecimentos da passagem de poder em Angola.

 

Nunca lá estive nem tenho interesses, não pretendo dar, aos angolanos, lições de ética –a tal não me atreveria com os casos, em Portugal, de corrupção, falências culposas de bancos, fugas ao fisco, nebulosas imparidades, etc.… - mas não posso deixar de sentir, enquanto ser humano, a desdita a grassar por país de tantas e vastas riquezas.

 

Passando a publicidade, numa das histórias do meu romance “Momentos para inventar o amor”, no capítulo intitulado “Mande queimar a roupa velha”, teço alguns pensamentos sobre essa coisa omnipresente e fugidia que é o poder e que, mais coisa menos coisa, se encaixa no reconto da transição de poderes em Angola.

 

Como a muita gente, certamente, desgostou-me a cleptocracia instalada naquele País no seguimento da independência. Observei, estupefacto, como o guerrilheiro se transformou em capitalista e como, de forma atroz, se permitiu espoliar os compatriotas das riquezas que, equitativamente, por todos deveriam ser distribuídas.  Apesar de não podermos outorgar-nos o título de impolutos na matéria, foi golpe rude nas convicções de quantos, defendendo a independência das colónias, esperavam um tudo mais de justiça e humanidade. Mas, o mundo é o que é, e lá fomos convivendo – alguns mesmo beneficiando – com o novo estado de coisas. Sentia-se, porém, de modos múltiplos, que o regime apodrecia, o nepotismo enfraquecia a sociedade, a grande riqueza ombreava com a maior das misérias. Desse desequilíbrio alguma coisa – nada boa – haveria de resultar.

 

Talvez por se aperceberem disto, sem dúvida estribando-se em razões de impossibilidade física do ditador, os donos do regime decidiram ser a hora - ia dizer da renovação - mas arrependi-me de imediato, e transformo em mudança. É que renovação, como a palavra indica, pressuponha que muitas coisas iriam ser revistas e modificadas. Mudança apenas indicaria o aparecimento de novos rostos nos lugares de poder, mas tudo o resto continuaria na mesma.

 

Algumas vozes de lutadores antirregime pareciam dar-me lastro a essa ténue esperança. Por isso esperei, confiado.  Voou o tempo e dois casos constituir-se-ão em muro de desilusão. O primeiro centra-se na incapacidade do regime angolano em perceber a separação de poderes. Trata-se, como é evidente, da alegada corrupção de um procurador da República por personalidade angolana. Só numa democracia se percebe e permite que um ex-governante seja julgado por qualquer crime, cometido dentro ou fora do mandato, bem como no poder soberano do aparelho de justiça, cego à qualidade social dos arguidos. Angola, segundo parece, não só não o pratica, como não o entende. A segunda prende-se com a transição de poderes.  Seria e pareceu, levemente, ser o momento oportuno para uma reviravolta positiva na governança do Estado. Muita gente acreditou e, a queda dos familiares do ex-presidente, permitia admitir tal hipótese. Deu-se o benefício da dúvida. Porém, na luta de galos travada no interior do partido no poder, em vez do debate sério, aberto, democrático, para a substituição das hierarquias, optou-se, mais uma vez, pela designação do mandante, segundo o interesse e dança de cadeiras dos interessados senhores do regime. Por outras palavras, o leão novo matou as crias do leão velho e substitui-as pela suas. Pouco mais se altera. Foi grande a desilusão!

 

Com o pedido de perdão ao autor de uma frase, que ouvi ou li algures, e não me lembro do nome, uso a sua interrogação: “como é que poderemos esperar que um partido que não se democratiza internamente, venha democratizar a sociedade.”

 

É isso mesmo! É triste! Mas, acontece!

 

 

 

 

Publicado in Rostos Online

 

 

 

 

 

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publicado por Carlos Alberto Correia às 19:30