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Adeus Amigo

Terça-feira, 14.07.09
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(uma pequena lágrima por Palma Inácio)

A penúltima vez que estivemos juntos foi em 13 de Maio de 2000, quando um enorme grupo de amigos se juntou para te ver receber, das mãos de Manuel Alegre, a Grã Cruz da Ordem da Liberdade, que o Presidente Sampaio merecidamente te outorgou mas da qual não quis fazer-te entrega pessoal. Sei bem que a justificação dada era que se não encontrava disponível por afazeres fora de Lisboa. No entanto, ironia das coisas, quando com os meus amigos Roque Laia, Santos e Pimenta (que aqui, sem o seu consentimento, trago por testemunhas) saímos, por uns momentos, da estufa-fria para irmos a um café, ironia das ironias, fomos afavelmente cumprimentados pelo ilustre Presidente da República o qual, calmamente, se passeava na rua, a escassos metros do acontecimento, com o seu filho. Não é caso para admirar. Foste sempre necessário mas incómodo. Os teus métodos não seguiam a linha da hipocrisia dominante. Para ti a luta não ficava apenas pelas discussões de putativos direitos em intermináveis debates. Tal como Hoederer, nas Mãos Sujas, de Sartre, também tu sabias que a revolução não era uma festa de salão e estavas disposto a dar tudo, inclusive a vida, pela sua realização.

Foste sempre o herói trágico e incompreendido. Muitos se utilizaram dos teus feitos mas poucos te reconheceram oficialmente os méritos. Já depois do 25 de Abril, quando tantos serventuários do fascismo se passavam de campo e continuavam a ter, ou ganhavam novas sinecuras, tu, o herói apontado às massas e aos estrangeiros como exemplo romântico do revolucionário, passavas fome e vivias mais que modestamente, nada pedindo para ti, tentando sempre fazer avançar a revolução, o socialismo, a liberdade e a igualdade.

Sempre te reconheci amigo do teu amigo e agradecido pelo pouco de bem que te fizessem. Por isso continuamente honraste Mário Soares que sabias companheiro seguro dos dias maus. Muitos te recriminaram, por tal posição, dizendo que fazias concessões de direita. Eram pequenos moralistas de circunstância incapazes de reconhecer o teu valor humano e de compreenderem que, para ti, revolução sem sentimentos e dignidade não era revolução.

Sinto saudades de ti, hoje, 14 de Julho de 2009 porque amigos me telefonaram, comovidos, dizendo “morreu o Velho”. Para te designar não usávamos nem era preciso outras palavras. Nem chefe, nem presidente, caudilho ou secretário-geral. Era apenas, simples e totalmente, o Velho! E estava tudo dito!

Outros te farão panegíricos e darão da tua vida a conta mais ou menos correcta. Não é minha intenção - nesta hora em que medito sobre a morte de um amigo que nos deixou ainda mais pobre do que era quando nasceu e que bem poderia ser um dos poderosos deste país (e não só) - desfilar os êxitos e os sofrimentos do teu percurso vital. Quero apenas recordar-me da nossa convivência, dos acordos e desacordos, sempre fortes mas frontais, que tivemos e da idêntica vontade de construir um mundo onde a humanidade prevalecesse sobre todas as doutrinas e a vida de cada pessoa decorresse sem vénias necessárias a qualquer tipo de senhor.
Sei que todos os teus amigos hoje se vão sentir um pouco mais sós. Faz parte do luto! No entanto o que nos vais deixar é a tua crença e a perseverança que sempre mantiveste, ao longo da vida, mesmo nos momentos mais dolorosos e deprimentes. Espero que sejamos dignos de ti e que, quando soar a nossa hora, alguém possa de nós dizer o que aqui sobre ti afirmo ao mundo inteiro: Que os sinos dobrem sem rebuço. Hoje, morreu um Homem!

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publicado por Carlos Alberto Correia às 17:46

nestas ruas o sentido

Quarta-feira, 01.07.09
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meu amor o desalento nestas ruas
é viagem perfeita de chegadas

toda a cidade nos envolve de sonhos
e promessas e angústias
portas ensombradas à espreita
das tuas pernas animais libertos
ao exterior das gentes

interiorizo enormemente esses momentos
plenos do sentido da passagem
e nos esquecimentos a mulher
é verdes penas sobre águas
nos dias invernais intranquilos
vaga consciência que adivinha
no rosto o passo solicitando o ventre

minha amada
são percursos do amor
o não chegar
quando a estrada
nos repudia os traços

tendo em conta a breve eternidade
que vamos obter
para nada caminho meu amor

alças a voz
arrebanhas o vento
e danças na música das algas
a tristeza semeada pelos muros

e no tempo de dizer-te meu amor
a voz vibra passado
sem timbre de futuro

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publicado por Carlos Alberto Correia às 17:34