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Memórias 9 - o amor da minha amada

Sexta-feira, 25.07.08



o amor da minha amada

não é só os lábios mas o modo de beijar


mais que os olhos de olhar

é a saudade distância

o amor da minha amada


nos tempos desse amor (ela uma rosa)

tacteei-lhe a medo o corpo

e mais afoitamente conheci-lhe os desejos


em cada pétala do seu corpo

eu fui o estame o pólen

e até me abri em asas de abelha


o lume que ela era todo ternura

queimou-me carne a carne


cada vez que a mim cedia

conquistava-se um pouco mais


de cada tentativa de pecado

saíamos mais puros e transigentes


às vezes vivíamos na calma das noites estivais

e outras não

fomos mistério e conquista

nunca duas vezes o mesmo


foi nestas lutas que o amor da minha amada

me conquistou


nunca as palavras nos custaram

nem nos envergonharam os sentimentos


construímos teorias destruímos preconceitos

um dia descobrimos que não éramos perfeitos
Évora, Fevereiro de 1968

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publicado por Carlos Alberto Correia às 11:41

falenas V

Domingo, 20.07.08





I


meu sal das manhãs início de intuição

a tua voz descreve-se violoncelo

adágio nostálgico estreia de percurso


és um rio uma ave um telhado

um carbúnculo de estrelas nas caves de casas marginais

um jornal gritado sobre o chão o rastro de um cometa

jornada em pauta musical nuvem de oboés

ou rútilos rasgos nas peles dos tambores


rompe-se o eco volatiliza-se a voz

no de lírio trémulo das velozes ocarinas

naufragadas entre tubas


a orquestra é um mar no som de baile dos teus pés


II


regressas e tudo é instantâneo e demasiado


então sobressaltas os meus dias em sons estranhos

perpassas entre música

branda visitante das pachorrentas horas

na digestão do tempo


ó voz de carne viva ó espírito das tranças de luz

abre um pouco as mãos dos violinos trágicos

com que despenhas rotas e dá-me

dessa água onde transmutas

o rictus em rito o nunca em ritual e o sempre

não assusta e é meta alcançável

num golpe das imaginativas cadências

percurssões ritmadas perfurando

em alternâncias lúbricas o perfume dos trópicos da música


III


tu continuas a dançar no imponderável do espaço

esvoaças e tudo cai mais mansamente ou se eleva

nas inabituais dimensões onde navegar

é o mais certo termo e viagem não é já

caminho para a decepção


tudo me é tão leve de ti


por isso mesmo o grito se me chega

e a inércia esvai-se nesta música


meu amor te digo e tenho nas palavras

o sabor de ervas bravas

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publicado por Carlos Alberto Correia às 13:33

Estava mesmo a adivinhar

Quarta-feira, 16.07.08








Treinadores de bancada e prognosticadores de após-jogo são elementos constantes no bestiário nacional. Fujo deles quanto posso mas, de quando em vez, sou arrastado, pelos acontecimentos, para esse preclaro grupo.

É o caso actual.

Quando vi o preço do petróleo a saltitar gráfico acima pensei com os meus botões: - alguém o vai alvitrar. Isto tem de vir à baila! É impossível que não venha! E zumba! Não é que acertei em cheio? Acusem-me agora de só vir falar depois de ELE o dizer. Porque foi ELE a primeiro a aventar a hipótese. E aventou bem pois, quando em casa de alguém que tem fome se diz que além há pão, o indígena acredita.

Para tal aproveitou um momento forte e solene. A divulgação do Relatório de seu Banco, com as previsões, desastrosas, para o segundo semestre de 2008 e para o ano de 2009. Não veio dizer nada que não soubéssemos já, mas o facto de ser ELE, Victor Constâncio, Presidente do Banco de Portugal, a dizê-lo e no local, forma e tempo como e em que o disse, dão a essa fala uma força estratégica dos diabos.

E que proferiu ele afinal, que eu já adivinhava que se viria a exprimir, só não sabia quando, porquê e por quem?

Simples e expectavelmente que, encarecendo o petróleo cada vez mais, não sabendo onde irá parar o seu custo, teríamos de encarar a possibilidade de recurso à energia nuclear.

Cáspite, senhor!

Então, Portugal, com oitocentos quilómetros de costa ventosa e de forte movimentação de ondas, com um interior quase deserto e com os níveis de insolação mais altos da Europa, com rios que ainda poderão fornecer muita energia, deve esquecer-se de tudo isto e passar, num ápice, para a energia da fissão nuclear? Nem um momentinho de paragem para pensar nos riscos da exploração, no armazenamento dos perigosíssimos e quase eternos resíduos, dessa instável, radiante e maçadora matéria sobrante? Não sei quem foi que afirmou o, com certeza, disparate de que só com as virtuais energias renováveis do nosso país, poderíamos suprir as nossas necessidade e ainda sermos fortes exportadores. Foi, certamente, alguém ou mal intencionado ou que não percebe nada destas coisas das energias e de negócios.

Por isso me lembrei logo da Central nuclear de Almaraz. Está ali, na região de Cáceres, junto ao Tejo, ameaçando-nos, sem proveito que se veja, com o seu potencial poluidor e explosivo. E sabem a quem pertence essa Central? Claro, à Iberdrola! E sabem quem é o Presidente da Iberdrola Portuguesa? Evidentemente o nosso Pina Moura, por mero acaso, Adjunto do Presidente da Iberdrola que é, como referimos, a dona da dita Almaraz.

Assim, se a Central vier a ser construída em Portugal digo já (para não voltar a ser apodado de prognosticador de depois do acontecimento) que o será, a Iberdrola terá i…mensas possibilidades de ganhar o concurso de construção e exploração. Olá, que tem!

É que, como diz o Belegário, recorrendo à sua sociologia de café:

-“Isto anda tudo ligado”.

Só espero, para poupar, e porque amor com amor se paga, a nova Central seja construída, junto ao Tejo, frente a Almaraz.

É que assim, no meio da desgraça, haveria ao menos a consolação do olho por olho…





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publicado por Carlos Alberto Correia às 18:41

Lamento angustiado de Belegário descrendo da justiça dos pequenos casos

Sexta-feira, 11.07.08







Ele, o Belegário, está amargurado e descrente. Decorre-lhe a angústia de ver a sua cruzada pela cidadania destruída pelo comportamento da Justiça, descrente porque se sente injustiçado em pedido feito, pelos meios próprios, às instâncias julgadoras da nossa sociedade.

Eis, na sua simplicidade, a causa próxima do lamento do meu amigo:

Corriam os idos do glorioso ano de 2004, o país usufruía o prazer milionário dos seus novos estádio, as bandeiras nacionais acompanhavam o ritmo alucinante dos progressos da nossa Selecção e Scolari, a ser português, poderia, caso o quisesse, ganhar eleições para a presidência da República.

Numa noite quente desse verão, cinco jovens saíram de um café onde assistiram a mais uma fulgurante vitória da Selecção. Entusiasmado pelas jogadas dos seus ídolos, um deles, demonstra, numa lata de refrigerante, o pontapé fulminante de um dos nossos rematadores.

Na emoção do momento a lata rola pelo alcatrão e, impudica, atravessa a rua enquanto o grupo quedava o passo e a emoção na paragem onde ficaram aguardando o autocarro que os transportaria para o centro da cidade.

É nesse instante que, de uma casa em frente, sai um homem, de calções e em tronco nu, olhando inquisitoriamente para um jipe parado junto à morada, agarrando na lata chutada, resmoneando ameaças para o grupo sentado, no murete de fronte, esperando o autocarro.

Pouco depois junta-se-lhe a mulher e, avançando para os jovens, de forma ameaçadora, invectiva-os agressivamente acusando-os de terem lançado “uma bomba” para a sua casa. O comportamento dele e da mulher visava nitidamente conseguir uma reacção violenta de algum dos jovens.

É aqui importante informar que, na perna dos calções, sustentado pelo elástico da cinta, emergia, bem visível, a coronha de uma pistola.

Resistiram com serenidade, os jovens, às ameaças e provocações ficando a aguardar pela polícia, entretanto chamada.

Chegada a patrulha, inicialmente pouco simpática para com o grupo, ouviu, como lhe competia, as partes. Pesquisaram, cheiraram a lata e na evidência de não haver odores de pólvora nem vestígios de qualquer rebentamento, alteraram o seu relacionamento para com os mancebos e informaram-nos de que tinham um prazo de seis meses para apresentarem queixa contra o provocador.

Neste momento é curial ouvir o Belegário.

- O meu sobrinho Filipe fazia parte do grupo e eu sei que ele é rapaz educado e cordato, bom estudante e excelente desportista, respeitador de pessoas e coisas. Enfim, um jovem com valores.

Conhecia vagamente os restantes rapazes mas, tanto quanto podia afirmar, não seriam de muito distinto comportamento do reconhecido no Filipe. Por isso, ele, Belegário, ardente defensor dos direitos cívicos pensava que o comportamento do homem era altamente atentatório do direito à liberdade e segurança dos cidadãos deste país e que tal atitude deveria ser sancionada.

- Com gente desta – rematava – vá lá alguém estar tranquilo quando os moços saem para um encontro com os amigos…

Assim, matutou seria esta uma boa ocasião para dar uma lição de civilidade de dois sentidos. Ao Filipe ensinaria a lutar pelos seus direitos, ao exaltado recomendaria uma abordagem mais consentânea dos seus concidadãos e ensinaria a não transportar uma arma letal para um confronto, com o risco sério de um descambar de situações potencialmente possibilitadoras de tragédia.

Por isso insistiu com o Filipe para que apresentasse queixa. Inicialmente reticente, após contactar com o advogado que o Belegário lhe indicou, decidiu avançar para a Justiça como forma de demonstrar o seu apego às normas de sã vivência democrática.

Com estranheza do advogado o processo arrastou-se no tempo e, o Filipe, constituído assistente, foi, pelo menos uma vez em cada ano de duração, chamado a prestar o mesmo depoimento. Dizia o advogado, espantado, que mais parecia ser o Filipe o acusado e que lhe parecia igualmente estar a estabelecer-se uma qualquer forma de protecção em relação ao arguido. Não é normal, exclamava!

Tanto que não era que, ao fim de quatro anos, o Ministério Público decidiu que não havia matéria para prosseguir pelo que mandava arquivar o caso.

Nem o Filipe, nem o Belegário, nem o advogado queriam acreditar em semelhante desconchavo. Então um cidadão é retido na sua deslocação, é ofendido, acusado de bombista, desafiado por atitudes, por um homem armado, para uma confrontação e não há matéria para acusação? Será necessário que o energúmeno abata um dia um passante para então ser considerado como perigoso o seu comportamento? Alguma coisa não cheirava bem neste caso.

Consequentemente o advogado não aceitou a decisão e sugeriu que se avançasse para um processo instrutório. Forte na sua indignada razão o Filipe anuiu à sugestão. Cria ainda na capacidade das instituições para dirimir com equilíbrio as dissensões criadas no tecido social. Mas qual quê! Passados meses o Tribunal, na sequência da decisão do Ministério Público, vem anunciar que nada existe na situação que possa ser considerado – pasme-se - matéria para deduzir uma acusação.

Para o Belegário isto foi o princípio de uma angústia profunda. É que, ao contrário do que ele pretendia, o caso, em vez de servir como exemplo para reforçar o sentimento de cidadania do Filipe, teve, precisamente, o efeito contrário. Hoje o Filipe, cansado das incómodas deslocações, repetidas até à náusea, para prestar declarações, não pretendendo do arguido nada mais que um pedido formal de desculpas, aborrecido pelo incómoda que causou às testemunhas, incomodado pelo pagamento que terá de fazer ao tribunal e advogado, chegou à conclusão que nunca mais, a uma agressão, responderá com a calma e o recurso às instituições. Forte nos seus vinte anos e na sua compleição física começa a convencer-se que a melhor defesa será o domínio físico e imediato do adversário. Ele fará, e no momento, a sua própria justiça.

Esta é, na verdade, a causa profunda da angústia do Belegário. De qualquer modo, procurando uma leve centelha de esperança, ainda pergunta:

- Esta decisão não terá alguma coisa a ver com o facto de sabermos agora que o arguido faz parte das forças de segurança…?



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publicado por Carlos Alberto Correia às 11:52

falenas - IV

Quarta-feira, 09.07.08




desenho-te em nome no tonus das palavras

peregrina indução desvelo transparente

entre o silêncio dos regatos e as árvores

pejadas de mágicos enleios


resguardo o teu olhar no percurso da memória

ó força inesgotável que sustenta

a fadiga da viagem


à tua volta o ar ainda é frémito e luz

ou delicados contornos ou cores onde habitas

amadurecendo cerejas ou rubras papoilas

meigamente enloquecidas pela agonia leve das pétalas

asas em sala hipóstila onde os sobreiros

gigantes plantados de espanto

calam o pó da planície


como os sobreiros

de braços abertos navego no meu sol

e me arranco naco de cortiça

que o ocaso faz escurecer


nos meus ócios lassos de injustiça

a longada da luta faz doer


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publicado por Carlos Alberto Correia às 17:57

Hermenêuticas, propedêuticas e outras “cabalêuticas”.

Quinta-feira, 03.07.08







Jorge Paulo de Carvalho, em texto publicado no Rostos, sob o título “O Bloco de Esquerda e a Hermenêutica” mostrava ao ignaro, ou, no mínimo, ao distraído público que uma distribuição de militantes, publicada em 2006 no Expresso, era, em todos os distritos, um número múltiplo de 61.

O texto, sarcástico quanto baste, era o que o Belegário chamaria de “bem apanhado”. Depois de uma gargalhada ou de um amarelado sorriso, falecia-se no efeito pretendido. Ficado por aí, cumprira o seu papel e com os cumprimentos e devidas vénias, estava o autor felicitado pela argúcia da descoberta e pelo humor do escrito.

As coisas são o que são e valem o que valem, excepto quando são o que não são e se pretende que valham mais que o merecido.

É o caso!

Em resposta, Humberto Candeias, igualmente no Rostos, fez inserir um outro texto “O Jorge Paulo Carvalho e a Propedêutica” no qual sugeria que os números insertos no Expresso, não seriam de pura fonte mas sim um constructo emanado de uma qualquer central de intoxicação.

Se por aqui ficássemos teríamos ficado em boa companhia.

No entanto, mudando o tom ao discurso, vem JPC em “O Bloco de Esquerda e a Factualidade” de novo à carga.

Desta vez, abandonado o tom jocoso que a brincadeira permitia, fazendo tábua rasa da sugestão avançada sobre a autoria da lista em questão, entra por uma diatribe em que acusa diversas pessoas, conotadas com o Bloco de Esquerda, de entrarem por “insultos e tergiversações”.

Tanto quanto me apercebi e foi possível ler, apenas um comentário publicado e em parte, era um tanto ou quanto despropositado. No entanto, sabe JPC, por lho ter sido comunicado por outros aderentes do Bloco de Esquerda, que essa não era a opinião geral, nem generalizada entre os aderentes. Dela, no entanto, não faz JPC notícia. Preferiu salientar a nuvem esquecendo Juno.

Escolhas!

Como cúpula do edifício e depois de considerações sobre o messianismo a que se pretenderia o Bloco, surge a terrível ameaça de, caso não seja produzida prova cabal de autoria estranha e malévola, o 61 (é a inflação, dantes era o 31) vai voltar em força por altura das eleições. Tremei, pois, vilanagem. O Justiceiro está atento e vigia-te.

O que é mais estranho nesta coisa dos números – e talvez seja prova evidente de alguma intenção pouco louvável na fonte da informação – é que o Jorge descobriu a existência oculta da constante 61, para o qual foi preciso, com certeza, perder algum tempo em análises que a mim, inteligente que sou, nunca me ocorreria fazer, passando, no entanto, em claro um outro sinal bem mais visível e que, segundo me parece, seria o destinado a produzir o efeito pretendido de descredibilização de um partido que procura uma ética social e política e que não vira a cara aos desafios socioeconómicos, incomodando assim, de forma constante, as centrais de poder.

É ele o caso da distribuição, pouco imaginativa, da quantidade de militantes por distrito. Temos assim uma estranha repetição de números. Em 8 distritos aparecem 122 aderentes, em 4 surgem 244, em 3 temos 305, só em 5 distritos aparecem números diferenciados. Estranho, não é? Seriam necessárias impossíveis coincidências, ou muita palermice, para produzir semelhante rol tão falho de imaginação e credibilidade. A quem serviria tal dislate? Está-se mesmo a ver: gato escondido com rabo de fora!

No entanto, como estamos em terreno cabalístico, há que entender o exótico hábito da divindade costumar escrever a direito por linhas tortas. De facto o que, possivelmente sem querer, JPC descobriu nestes pobres números foi uma mensagem oculta do sagrado. É que, feita a prova dos nove, 61 dá 7, cardinal que como todos sabem é o indicativo da Criação e o número da Perfeição. Olaré, que é!

Nunca nos pensámos tão bons, mas agradecemos empenhadamente o esforço e a intenção.



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publicado por Carlos Alberto Correia às 21:01